sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Desperdício Vital

DESPERDÍCIO VITAL

Fábio Henrique Ribeiro Pereira*

Em entrevista concedida ao programa Almanaque da Globo News em 21.02.2005, o cientista social Ricardo Petrella, especialista em questões relacionadas à água (consumo, política, gestão dos recursos hídricos etc) alerta para questões importantes no que diz respeito à utilização desse importante recurso natural.

O que mais chamou a atenção naquele relato foi o alerta no qual o especialista estima que num prazo máximo de 20 anos, a água, caso continue sendo consumida nos moldes atuais pode gerar conseqüências gravíssimas para populações de diversos países que sofrerão pela falta de água potável para o consumo e conseqüentemente para sobrevivência.

A questão do desperdício de água potável em atividades industriais, siderúrgicas, automobilísticas, construção civil, também é preocupante, pois gasta-se grandes quantidades para fins diferentes daqueles considerados vitais para a população mundial.

Na última conferência mundial ONU de recursos hídricos, onde reuniu centenas de chefes de estados e representantes sugeriram a cobrança pelo uso da água de forma a torná-lo racional, preservando para as gerações futuras. A água foi tratada assim, como bem econômico.

O estudioso alerta também para a questão da poluição dos recursos hídricos (rios, lagos, lençóis freáticos, aqüíferos) por atividades antrópicas, tais como a agricultura, que utiliza pesticidas, fertilizantes e atividades industriais que lançam seu lixo industrial diretamente no ar, na água sem nenhum tipo de tratamento.

Fez ainda alusão para a tragédia dos rios que estão morrendo e que não chegam mais até o mar, devido à construção de represas, barragens, hidrelétricas e o bombeamento para processos de irrigação. Cita como exemplo o Rio Colorado nos Estados Unidos que diante de tantas construções teve seu volume diminuído e conseqüentemente sua capacidade de atingir o oceano interrompida. No Brasil, a intensa atividade urbana (predatória) e as atividades agrícolas têm causado além da poluição, processos de esgotamento e assoreamento de rios, prejudicando inclusive a navegabilidade.

Devemos lembrar ainda que a perfuração indiscriminada e sem fiscalização de poços tem tornado cada vez mais caras e mais profundas as chances de se encontrar águas subterrâneas. Se antes era necessário perfurar 20,00 m para achar água potável com o tempo a possibilidade aumentou para 40, 60,80...até quando se tornar inviável.

A entrevista aborda ainda outros aspectos importantes desse cenário atual de uso da água: a briga de países pelo seu domínio, fato que vem acontecendo em países do oriente médio onde o recurso é bastante escasso e chefes de estado o utilizam como moeda e fonte de barganha e ganhos políticos. Tal briga por esse recurso bem como as guerras que tem ocorrido pelo petróleo mostram claramente porque irão se digladiar nas próximas décadas os países poderosos.

Segundo ele , aproximadamente 97,5% de toda a água do planeta é salgada, o restante é doce destinado ao consumo humano. Desse restante o desperdício, a poluição e a má utilização dos recursos tem tornado-o cada vez mais caro e raro.

A entrevista encerra com a mensagem de que temos condições tecnológicas e econômicas de permitir que as futuras gerações tenham acesso à água potável, bastando para isso adotarmos medidas emergenciais, de contenção (eliminação) de desperdícios e destinação do recurso, apenas na medida que couber para determinado fim e cobrar dos usuários para que tenham consciência da importância vital desse recurso.

O Direito Brasileiro trata os recursos naturais como sendo um bem difuso, ou seja, é de todos e não é de ninguém, e o Estado como gestor tendo a incumbência de geri-lo da melhor maneira, de forma a torná-lo acessível a todos, além de permitir a sobrevivência, e isto vale para água, ar, alimentos,etc.

O mesmo direito, no aspecto ambiental diz ainda que o dano ambiental é solidário, ou seja, caso ocorra algum impacto ou que prejudique o fornecimento dos recursos naturais, todos somos culpados, pois devemos ser fiscais das atividades potencialmente poluidoras e isto vale para a água; o bem mais precioso, pois dela dependemos para a sobrevivência. Diante desses fatores cabe-nos questionar: até que ponto uma atividade potencialmente poluidora dos recursos hídricos (sem contar os demais) é benéfica a uma região? E nas regiões nas quais as grandes indústrias estão sendo implantadas e que vêm ocorrendo prejuízos à população e do meio ambiente local, qual a melhor forma de assegurar qualidade de vida às populações?

O Brasil, como país que detém a maior porcentagem de água doce do planeta tem a obrigação de encabeçar uma política mundial para uma gestão de recursos hídricos global, da mesma forma que tem procurado tratar a fome, pois no futuro, além da fome os pobres terão sede; daí para o fim é um passo.